1 de mar. de 2014

Noite de autógrafos

O editor me ligou e disse, garoto, vamos publicar seu livro. Era tudo o que eu queria ouvir.

Passei anos escrevendo e finalmente sairia meu sonhado livro. Só que com outro nome: Afinal, quem é esse tal Rubem Fonseca? Sugestão do editor.

Livro pronto. Edição fenomenal com ilustrações nas páginas, cada hora era uma situação diferente com pessoas lendo. Pensei, só faltou um prefácio do Zé Rubem. Mas aí seria um sonho. Ele saber do livro já é o suficiente.

Uma semana atrás ligou o editor e disse, garoto, você nasceu virado para a lua, só pode. Perguntei por que e ele me disse, o Rubem Fonseca faz questão de conhecê-lo. Disse para passar na casa dele às nove da noite para um jantar de lançamento do seu livro.

Nunca imaginei isso. Um jantar de lançamento? Na casa dele?

Pois bem, aqui estou. Ao lado de um senhor que parece meu avô, fino, educado, e eu, um jovem escritor que não sabe se está perdido no mundo da lua ou dos livros. Tem mais livro aqui do que na biblioteca.

Casa cheia de gente, inúmeros escritores, pessoas falando línguas diferentes. E eu no meio, quieto, sem abrir a boca.

O Rubem chega ao meu lado e diz, vamos sentar e autografar os livros agora? Sentamos à mesa de sua biblioteca e forma-se uma fila. E eu quieto, mudo. Primeira pessoa a chegar com um livro para autógrafo é o João Ubaldo. Depois de cumprimentar o amigo, disse com a voz grave, meus parabéns garoto. Tiramos uma foto.

Em seguida vem o Verissimo. Aí já é brincadeira. Meu livro ficou uma porcaria e ele convidou todos para rirem de mim, só pode. Não é possível! Eu, sentado ao lado do Rubem, autografando livro para o Verissimo. É uma brincadeira... Nenhuma palavra dita. Difícil saber quem é mais calado. Tiramos uma foto. Rubem Fonseca na ponta, Verissimo no meio, e eu.

Um raro momento de percepção me faz pensar, o que estou fazendo aqui?

Em seguida alemães. Eles conversam em alemão, riem, depois tiramos uma foto.

Quando eu penso que termina meu sonho aparece alguém familiar. Desta vez é a Patrícia Melo. Ela e o marido. E eu ali. Mais uma foto.

De vez em quando o Zé Rubem me olha e comenta sobre alguém. Ele mesmo não falou nada do livro até agora. E eu louco querendo saber sua opinião.

E eu achando que nada mais pode me surpreender até aparecer na minha frente, rindo com um copo de uísque na mão, ninguém menos que o Chico.

Fico pasmo, olho para o lado e pergunto, o senhor está brincando comigo? O que eu fiz para merecer isso? Ele me olha, sorri, passa o livro e diz, dedique-o ao Chico. Eu autografando um livro para o Chico Buarque, era só o que faltava. Tiramos uma foto – essa eu faço questão.

Agora só falta aparecer o Dalton Trevisan. E Jesus em carne e osso.

Pelo menos ninguém leu o livro até agora, então de hoje eu passo. Amanhã virão os comentários, as críticas, as resenhas, as crônicas. Aí ferrou! Enquanto isso vou sonhando aqui.

E não é que está à minha frente Antônio Candido. Isso é uma piada, só pode. Todos cumprimentam sorrindo, felizes em ver o amigo. E eu, tirando foto e autografando livros.

Enfim uma pessoa conhecida, meu editor. Consigo falar com ele, o que é isso, uma brincadeira comigo? Querem me humilhar logo de cara? Ele ri e me diz, sorria para a câmera, faço questão dessa foto.

Bebo um gole de água enquanto meu anfitrião conversa em inglês com seus convidados. Fico observando as pessoas por aqui, todas felizes em estar aqui. Se há rixa entre eles o problema não é meu. Ainda mais meu... No canto estão Verissimo, Zuenir Ventura, Affonso Romano e Marina Colasanti e mais umas pessoas conversando.

Enquanto presto atenção nas pessoas chega ao meu lado uma senhora e diz, garoto, agora o seu. Nélida Piñon; distinta e fina, como sempre. Tiramos uma foto.

Essa casa está mais refinada que feira literária. Atores, escritores, diretores, tem de tudo aqui. Até eu. Juro que até agora não sei o que estou fazendo aqui. Devia ter convidado o Ildo, ele ia gostar daqui.

Se essa câmera fosse minha colocaria todas as fotos na internet, na mesma hora. Como não é minha, e como é do filho dele, nada de foto na hora na internet. E por falar em filho, está à minha frente seu filho diretor de cinema. O máximo que consigo dizer a ele é que adorei Mandrake. Foto com a família. Avô, pai, filho, e eu na foto. 

Só agora aparecem meus pais. Os únicos que convidei. Não consigo escutar o que meu pai conversa porque minha mãe está falando para eu olhar para o celular, pois está tirando uma foto nossa. Só ouço meu pai agradecer e vir para falar comigo. Meus parabéns, filho, meus parabéns. Tiramos uma foto – e uma com o celular da minha mãe.

Autografamos mais uns exemplares de amigos estrangeiros – acho que cubanos – e enfim vamos jantar. Não vejo a hora de ir embora. Não sei o que estou fazendo aqui.

Finalmente todos os livros foram autografados. Olho para o lado e está o Rubem Fonseca me pedindo para autografar um exemplar para ele. Olho bem para o olho dele e digo, o senhor está brincando comigo, isso aqui é uma piada, não é? Ele sorri, apenas. Então por favor autografe um exemplar para mim. Pronto, autografamos um para cada. Tiramos uma foto, só nós dois, ambos com um livro.

Pergunto aos meus pais o que acham de irmos embora e eles são enfáticos, nós seremos os últimos a sair daqui.

Jantar servido e todos comendo e eu pensando, daqui a pouco um engraçadinho pergunta de onde tirei a ideia para o livro. Só me falta essa. Nosso anfitrião pediu a palavra e o silêncio pairou. Antes de mais nada, começou a falar, agradeço a presença de todos...

Cadê uma faca? Droga, não tem ponta. Não posso deixá-lo falar. Mas não tem jeito, a casa é dele, os amigos são dele, o jantar é dele, meu livro é dele. Tenho mesmo é que ficar quieto, na minha, o mais calado possível. Já sei, comer camarão, bastante camarão, para morrer de alergia agora mesmo.

Pego a colher para me servir e minha mãe diz, meu filho, você não pode comer camarão, tem alergia, esqueceu?; desculpe interromper. Todos me olham.

Depois de jantar chego perto de meu pai e digo, o que vocês conversaram? Meu filho, aproveite a noite, apenas isso – foi sua resposta.

As pessoas começam a se retirar. Agora é hora de despedir. E parece que todas as pessoas gostam de se despedir, todos vêm até mim e dizem, até mais. Como se fôssemos nos ver novamente. Quando encontrarei o Verissimo novamente? Só se eu for a uma palestra dele numa dessas feiras literárias.

Enfim todos foram e meus pais despedem e agradecem pelo jantar.

Cumprimento e agradeço pelo jantar. Ele faz o mesmo, e me diz, seja bem-vindo, garoto.


Bem-vindo ao inferno, só se for.  

3 comentários:

Gisele Freire disse...

Que legal Marcio, gostei muito :)!

Estava lembrando que meu antigo blog tinha o nome de "Vastas emoções e pensamentos imperfeitos" :)

Abraço :)

Quero ver essas fotos do jantar... :)

Gisele Freire disse...

Que legal Marcio, gostei muito :)!

Estava lembrando que meu antigo blog tinha o nome de "Vastas emoções e pensamentos imperfeitos" :)

Abraço :)

Quero ver essas fotos do jantar... :)

Unknown disse...

Gisele, eu lembro bem do seu blog; eu lembro dos poemas e sei que gosta do Leminsk, Manuel de Barros...

Que bom vê-la por aqui.

Pena que as fotos eu consigo colocar aqui...

Um beijo