25 de jan. de 2014

Olha a merda que deu (19)

O fim dessa história deveria ser eu me tornando professor de português para crianças, mas não, isso é só o começo.

Formei em letras sem querer, tentei seguir carreira acadêmica, mas a academia é lugar para pessoas medíocres - é o único lugar que esses professores de merda podem achar que são alguma coisa.

Enfim, virei professor de crianças. Fora a vontade de estrangular um por um todos os dias da semana, o que me mais me irrita, fora ver a gorda da coordenadora todo dia, é falar com os pais dos alunos.

Ser professor de português é a coisa mais idiota que uma pessoa pode ser na vida. Você não ensina quase nada de útil, só regrinhas gramaticais que as crianças nunca vão usar, a não ser para responder nas provas.

O que mais me tira do sério mesmo é escolher livros para essas crianças. Nunca pode ser livro bom, a cada ano o livro deve ser mais idiota porque a cada ano o nível cai um pouco. Eu tento um pouco dos bons cronistas, mas o máximo que consigo é um do Verissimo por ano.

E os meninos ficam me fritando para eu passar esses livros de vampiro, bruxos, Harry Porter, o menino para-raios, e as meninas pedem aqueles romances adolescentes idiotas. E eu sempre tenho que ler essas porcarias. Passo o ano lendo essas merdas, e o pior, corrigindo as besteiras que as crianças escrevem nas provas. Eles pedem os livros, acabo escolhendo esses livros e um ou dois leem, o resto assiste ao  filme ou pega o resumo na internet.

Uma segunda-feira, na entrega das notas da prova do livro, mais nota vermelha que tudo, com raiva e ressaca - passei o domingo corrigindo essas provas no Zé da Gelada - cheguei na sala com vontade de pegar uns três pelo pescoço e falei, vocês pedem pra ler essas bostas, não leem nada e ainda tiram essas notas ridículas, bando de... Eu deveria passar pra vocês um Rubem Fonseca.

Uma menininha nerd disse, quem?

E eu, com raiva, repeti, Rubem Fonseca, mas não é pra vocês, vocês não entenderiam nada dele.

Uma semana depois essa menina aparece com uma coletânea de contos dizendo, já li quase todos, professor, tem umas histórias que não têm fim, né?

Menina, eu disse, guarda na mochila esse livro, só abre daqui uns dez anos.

No dia seguinte recebo da mesma menina um bilhete de sua mãe, e bem na hora que fui ler a inspetora me chamou para uma reunião com a diretora,a coordenadora e uma mãe.


Olhei pra menina e pensei, quem eu estrangulo primeiro? 

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